Saiu no Jornal de Brasília em 28/07/2006
Ibama terá de apontar os motivos pelos quais pediu a retirada de casas em APPs de Vicente Pires
Lúcia Leal
A 21ª Vara Federal do Tribunal Regional Federal (TRF) solicitou ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que justifique o motivo pelo qual pede ao GDF que faça a derrubada de casas que estão em Áreas de Proteção Permanente (APPs), em Vicente Pires. O órgão terá dez dias para responder aos questionamentos. O Ibama espera que suas respostas sejam acatadas, caso contrário poderá tentar derrubar a liminar que suspendeu a retirada das casas que estão em área ambiental.O Ibama terá também de dar um posicionamento à procuradora Ana Paula Mantovani Siqueira, do Ministério Público Federal (MPF). O prazo que ela deu ao órgão para que avaliasse o Termo de Ajuste de Conduta (TAC), firmado com o GDF e que não está sendo cumprido, termina na segunda-feira.De acordo com a recomendação da procuradora, o ponto mais grave de descumprimento do documento é a proliferação de novas casas em áreas verdes de Vicente Pires. Pelo TAC, as construções que existiam nessas áreas deveriam ser derrubadas e, além de isso não ter sido feito, a cada dia surgem novas edificações.O superintendente do Ibama-DF, Francisco Palhares, afirmou que na segunda-feira terá uma reunião com a procuradora. "Vou mostrar que a gente tentou fazer cumprir o TAC, tanto que o GDF apresentou o cronograma de derrubada mas, com a liminar que os moradores conseguiram, ficamos impedidos de dar continuidade ao processo de retirada das casas", explicou.Palhares quer pedir à Ana Paula Mantovani um ajuste no atual TAC. "Vamos ver a possibilidade de estender os prazos. Ninguém quer a suspensão do TAC", afirmou. Isso vai de encontro com o que quer o GDF.Pelo cronograma apresentado, o governo pede um prazo até abril para retirar as 549 casas que estão nas APPs. As primeiras 15 começariam a ser retiradas na segunda-feira. O TAC, no entanto, vence em setembro. ProblemasIbama e GDF querem responder ao juiz antes do prazo dado. Segundo Palhares, os técnicos do Ibama, da Caesb e do Siv-Água já estão em campo. "Vamos fazer um laudo dos problemas que essas construções em APPs podem causar. Contamos com o bom senso do juiz para que acate nossos argumentos, se não poderemos recorrer", afirmou. Palhares garante que a contaminação do córrego Vicente Pires pode comprometer toda a Bacia do Paranoá. Ontem, representantes do GDF mostraram o cronograma ao Ibama. Palhares vai estudar o documento para apresentá-lo à procuradora. Apesar do vaivém judicial, o Ibama continua notificando os donos das casas irregulares. Mais de cem receberam o aviso para liberar as construções em 30 dias.O presidente da Associação Comunitária de Vicente Pires, Dirsomar Chaves, defende o diálogo. "Não dá para querer tirar uma família que mora há 25 anos na casa só porque está perto do córrego. Queremos sentar para discutir o que está errado", disse. Palhares foi direto: "Pessoas que ocupam APP são criminosas e devem responder por esse crime no Ministério Público".
Moradores estão confusos
Os moradores da Colônia Agrícola Vicente Pires estão confusos sobre o futuro da área. Muitos apóiam a demolição de casas construídas próximas ao Córrego Vicente Pires, mas acreditam que os órgãos responsáveis deveriam definir os critérios de derrubada das construções. É o que pensa o aposentado Carlos Alberto Rosa, 51 anos, que mora no Residencial Veneza, na chácara 3 B, lote 376, a 180 metros do córrego. Nesta quarta-feira, demoliram a casa do vizinho dele. "Não entendo o motivo da derrubada. Ele não havia recebido notificação do governo. Segundo o Ibama, são considerados prejudiciais ao meio ambiente apenas as casas construídas a menos de 30 metros do córrego. A casa estava bem distante", argumenta. Segundo Carlos Alberto, o vizinho estava construindo a casa para se mudar de outra bem próxima ao córrego. O aposentado garante ter herdado um terreno na beira do riacho e loteou para a construção de algumas casas do residencial onde mora."Há 11 anos, havia várias casas próximas ao lençol freático, mas conseguimos tirar quase todas. Sobrou apenas uma, cujo dono estava prestes a sair. Estamos fazendo tudo para estar dentro da lei, porque queremos regularizar Vicente Pires", completa Carlos Alberto. Ele afirma que ainda existem muitas mansões das chácaras 15, 16 e 17 de dois andares construídas a menos de 30 metros do córrego. "O prejuízo vai ser grande", acredita.O vendedor Emerson Sales, 18 anos, mora na Colônia Agrícola Cana do Reino, onde planta hortaliças. Há anos espera a regularização da Vicente Pires para que sua chácara passe a fazer parte do condomínio, mas acredita que isto vai demorar muito para acontecer. "Existem muitas casas irregulares. O trabalho para retirá-las de lá será grande", prevê Emerson. Ele reconhece que várias construções não têm estrutura para ficar próximas à fonte de água. "Em muitos locais não há esgoto, e o lixo cai diretamente na água", lembra. Infra-estruturaO autônomo Luciano Oliveira, 35 anos, mora há cinco em um condomínio na chácara 180, no centro de Vicente Pires. Ele comprou o lote na esperança de que o local fosse regularizado em pouco tempo. Hoje, não sabe se apóia a derrubada das casas próximas ao córrego para apressar o processo ou se defende os vizinhos. "Quero a regularização, desde que ninguém saia prejudicado", diz. Luciano sugere que o governo indenize os donos das casas demolidas, mas sabe que esta proposta é incoerente. "Eles sabiam que o terreno é irregular", diz. O autônomo ressalta que Vicente Pires está crescendo e precisa de infra-estrutura. "Precisamos ajustar nossa situação. Pagamos todos os impostos, mas não temos sequer uma agência bancária", completa.
Cuidados na compra de lotes
O diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), dr. José Geraldo Tardin, alerta que comprar lotes requer muita precaução e assessoria de um advogado especializado, visto que existem loteamentos irregulares e clandestinos e, dependendo do caso, o consumidor poderá ter perdas de até 100% do capital investido, principalmente se essas áreas são de mananciais, utilidade pública ou de outro proprietário.
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